segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Ainda não é desta!

Ainda não é desta que volto ao activo, possivelente só depois de deixar o part-time que me tem tirado muito do tempo que tinha anteriormente, mas vou aproveitar este local sem grande visibilidade para deixar um desabafo.

Cada site relacionado com a enfermagem, ou com as altas instâncias da enfermagem (para ser mais correcto) que visito, tenta passar a mensagem que os problemas da profissão são culpa dos próprios enfermeiros, ou seja, se algo está mal a culpa é nossa.

Não sou anjinho, até certo ponto é verdade, mas não nos aspectos que a Ordem, e principalmente os sindicatos defendem. É certo que não há espírito de grupo nos enfermeiros, que somos uma classe com uma individualidade própria, e mesmo um bocado mesquinhos, há que o admitir com frontalidade. Enfermeiro que é enfermeiro quer ser mais que o outro ao lado, e não olha a meios para atingir esses fins.

Mas isso não tem a ver com os actuais problemas da profissão. O desemprego, a instabilidade de emprego (vulgo, contratos precários) e o excesso de formação.

Começando do fim, o excesso formativo. A Ordem e Sindicatos sempre bateram no sacana do cavalo das cotas europeias, que faltavam os famosos 30 mil enfermeiros e XPTO, com isto foram pactuando com o aparecimento das privadas, quais cogumelos em locais húmidos, que formam com qualidade duvidosa, enfermeiros com, aqui falo da minha experiência pessoal como tutor, menos competências profissionais, mas que têm tantas ou mais cunhas que os outros, e médias bem superiores aos colegas das escolas públicas, conseguindo emprego com maior facilidade.
Forma-se em excesso, muito acima do que os hospitais admitem, o que leva ao desemprego, e não só.

Havendo oferta em excesso, as entidades empregadoras apenas precisam de abrir a boca, oferecem as condições que querem, mais cedo ou mais tarde alguém aceita, ninguém andou a tirar um curso para ir trabalhar para o Modelo, mas tenho alguns colegas a ganhar menos que um amigo que trabalha na Worten, enfermeiros pagos muito abaixo da tabela, que já de si não corresponde ao nosso grau de formação, pois somos Licenciados, mas apenas recebemos como Bachareis.

O que me irrita nas altas instâncias é transparecerem a mensagem que nós é que somos os culpados! Acho que esses senhores, já com a vida bem estabilizada, sem saberem já o que é o trabalho, se esqueceram do que é o desemprego, ou viver no risco de perder o emprego se levantarmos a voz, pois se eu estou insatisfeito, a minha entidade empregadora nem fica chateada, manda-me embora e põe outro. Quem ficou a perder? Eu, claro!

Afirmam à boca cheia que não aderimos às greves, e manifestações, quando a realidade que temos é esta:
- os mais novos vivem no medo de serem despedidos;
- os mais velhos têm necessidade do dinheiro.

Andam todos cagões a dizer que já somos os maiores do país (a Ordem), para os sindicatos pagamos 1% do salário, para um recém-licenciado são cerca de 9€ (só os sindicalizados pagam), para a ordem um bocado mais de 7€ (só paga quem está a trabalhar), isto por mês, isto depende do escalão, aumenta conforme se está num escalão maior, estes são os valores mínimos.

A tão apregoada ordem de 21000 elementos ganha, por mês, descontando 3500 desempregados, 122500€, os Sindicatos, apontando para um número ao calhas, cerca de 11000 sindicalizados, 99000€.

Porque falei nisto? Nos grandes países da Europa, as greves são pagas! Quem adere e é sindicalizado, vê o dia de ordenado pago pelos sindicatos, aqui, claro, isso não acontece, quem o faz é por sua conta.

Na Ordem, a minha pergunta é esta: Para onde vai esse dinheiro? Nos sindicatos deve ir para a papelada, imagino, nem quero ser mau e dizer o que penso mesmo, de ambos.

Aqui há uns tempos, a nossa bastonária (já agora realço que tem um bonito bigode) teve um convite para participar num programa televisivo com algum mediatismo. Ao invés de falar dos nossos problemas, mesmo quando questionada directamente sobre tal, preferiu voltar a tocar no dogma das cotas europeias, algo que nunca vai ser aplicado cá, é irrealista e não vale a pena entrar por esse caminho, voltou a congratular-se por ter a maior ordem do país, equecendo uma das maiores taxas de desemprego e instabilidade profissional do país.

Quando questionada sobre o excesso de escolas, embatucou, mandou um parlapie qualquer, meio embrulhado, querendo estar bem com Deus e com o Diabo.

Voltam a falar das carreiras, para não aceitarmos os termos negociais. Eles, que estão no topo da carreira, e não quiseram negociar em tempos de vacas gordas, querem agora negociar sem haver dinheiro. Felizmente acho que já está mais ou menos acente que vamos ganhar como licenciados, mas não querem que o pessoal aceite porque as progressões serão quase nulas. A isto eu digo:

Mas vocês estão em que planeta? Mas acham que vai haver progressão, seja qual for o salário? Eu sei que serei sempre enfermeiro ralé, não vamos passar da cepa torta, quem já está na carreira tem o seu estatuto assegurado, lebrem-se de nós, não apenas de vós.

Tenho muito mais indignação cá por dentro, mas não têm que me estar a aturar com estas lamurices.

Espero poder voltar mais activamente dia 21.

Tudo de bom.

4 comentários:

Teté disse...

Caríssimo melga: lamento informar-te, mas aquilo que referes em relação à ordem e sindicato dos enfermeiros, acontece também em relação a muitas outras profissões. Para já não referir estágios obrigatórios, não remunerados. E é assim há anos, para uns se sustentarem com o trabalho dos outros, e os mais novos terem sempre dificuldades em encontrar um emprego digno desse nome! (sem cunhas, está claro)

Até hoje ainda me custa engolir a indignação do que aconteceu comigo e que, infelizmente, ainda é possível que aconteça com o meu filho.

Vá, boa sorte para ti, que nestas alturas é bem necessária (pelo menos para os que não têm cunhas)!

Beijocas!

melga disse...

Eu tenho emprego, custa é que quem me devia defender, me acuse como se fosse um criminoso!

Lanço o exemplo dos professores, é mais fácil fazerem uma greve/concentração num fim-de-semana porque não trabalham, e à semana porque não têm de assegurar serviços mínimos.

Se fizermos greve, o utente mal nota, salvo raras excepções, e o desgraçado que fica a assegurar serviços mínimos trabalha que nem um escravo, e ainda ouve as reclamações de toda a gente.

Isto é uma mera revolta pessoal, nem quis fazer o paralelismo com outras situações, pois aí corria água como o raio.

É a situação em que nos encontramos, e não vejo forma que isto melhore.

Ana disse...

Lol,melguito, ia começar a dizer o mesmo que a tete. Se te consola, o mesmo acontece nos outros meios.No meu então, a exploração é lei e é chulice ao rubro porque muitos de nós alombam que nem cães e não recebem um tusto (mas nem um centimo mesmo) para isso. É assim com os estágios de licenciaturas e com os mestrados, por exemplo. Até os alunos de doutoramento são explorados (quem achas que mantém a ciencia a funcionar e as aulas a rolar?!) e esses têm uma bolsazita e zero segurança e regalias...
Percebo a tua revolta, é tua e é nossa. Estamos contigo, senhô enfermeiro! =)

melga disse...

O que ainda nos vale é que já estávamos a contar...